GANHAM O ESTADO E A SOCIEDADE

Bicho solto

Legalizar o jogo do bicho quebraria um tabu, geraria receitas bilionárias e teria uma grande carga simbólica de transformação

No vale-tudo para sairmos do buraco fiscal já circulam propostas para a legalização de bingos e cassinos no Brasil. É patético, no mar de lama e trapaças em que vivem, governo e Congresso alegarem razões morais contra a liberação do jogo. É ótima a oportunidade para legalizar, taxar e fiscalizar cassinos, como nos Estados Unidos, Inglaterra, França e Portugal, criando empregos e aumentando a arrecadação.

Melhor ainda seria legalizar o jogo do bicho. Que forças estranhas impedem quebrar esse tabu que pode gerar receitas bilionárias e uma grande carga simbólica de transformação?

Quem são os maiores interessados em manter a proibição? Os bicheiros, é claro, e todos que eles empregam e corrompem. Faz tempo que o simpático jogo do bicho, uma das instituições brasileiras com maior credibilidade popular, não é mais aquele. Hoje é um conjunto de organizações criminosas que exploram máquinas caça-níqueis e de videopôquer viciadas para roubar os pobres, quadrilhas que lavam dinheiro, corrompem policiais, políticos e juízes, interligam-se ao mercado de armas e drogas. E disputam territórios a tiros.

Que misteriosas razões permitem apostar em cavalos mas não em outros bichos? Por que o Estado deixa os pobres perderem seu dinheiro em loterias e jogos apropriadamente chamados “de azar” e protege os ricos e os turistas de perderem o deles em cassinos reais, em vez de torrá-los nos cassinos virtuais da internet?

No Brasil, aposta-se livremente em incontáveis modalidades de tirar dinheiro dos pobres. E o maior banqueiro de jogos do país é o Estado.

Sou privatista militante, mas, no caso do bicho, é melhor que o Estado assuma a operação com a estrutura lotérica que já tem, tudo digital, em tempo real, fiscalizado e controlado. Para tirar esta massa colossal de dinheiro das mãos de bandidos e corruptos e usá-la em segurança pública, saúde e educação.

Mas nesse governo não vale o escrito: o maior perigo de estatizar o bicho é empregar tantos burocratas e funcionários, gastar tanto em escritórios, salários, benefícios, impostos e taxas, que não vai sobrar dinheiro para pagar as apostas.

(*) Nelson Motta é jornalista e produtor musical veiculou o artigo acima na editoria de Opinião do O Globo e Globo Online.